segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Sobre livros e malfeitores

Há muitos anos, tive em minhas mãos um livro cujo título não lembro, mas era algo como “100 dicas para proteger sua casa contra assaltos”. À primeira leitura, achei o livro bem interessante, porém, algo me incomodou: para ensinar como defender o seu lar, o livro ensinava como os bandidos agiam, como eles escolhiam os alvos, como desligavam alarmes e como arrombavam os diferentes tipos de fechadura. Ora, não era somente um livro sobre segurança residencial, era também um manual de como assaltar casas! Tudo dependia apenas da intenção do leitor.

Um exemplo mais atual são os livros sobre como proteger o seu micro do ataque de um hacker. Esses livros terminam indicando para o leitor de má índole portas de acesso ao computador alheio.

Querem mais um exemplo? Tenho um livro chamado Contra-ataque – para vencer a guerra contra o terrorismo, este se propõe a debater o problema do terrorismo e indica medidas de contraterrorismo. A iniciativa é boa, porém, também ensina como esconder um dispositivo de lançamento de foguetes em um carro, ensina como o tanque de combustível de um carro-bomba deve estar para que a explosão seja bem-sucedida, ensina a escolher alvos, entre outras coisas. Eis aí uma cartilha de terrorismo.

Fica a pergunta: o que fazer quanto a isso? Sinceramente, eu não tenho uma resposta. Talvez um pouco mais de cuidado da parte dos escritores e editores. É possível indicar qual fechadura é a mais segura sem ensinar como arrombar as outras.

Há quem sugira a proibição de livros assim. Discordo e, automaticamente, lembro-me do embargo que a ONU impôs ao Iraque antes da guerra que depôs Saddam Hussein. Entre os produtos que esse país não podia importar, estavam lápis e canetas. Isso mesmo, lápis e canetas! Temia-se que a tinta ou a grafite fossem utilizadas na fabricação de armas químicas. A ONU optou pela proibição, a solução mais simples, e quase fez com que toda a população de um país voltasse ao tempo das tábuas de argila. Sorte dos iraquianos a penicilina não poder ser usada para a fabricação de armas biológicas.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Eu vi

Eu confesso. Sempre tive uma queda pelo Saci. Lembro da minha mãe contando como ele era: negrinho, de uma perna só, com um cachimbo na boca e um gorro vermelho na cabeça. Era esperto – sagaz! – fazia travessuras e agrados, era herói e capeta, perneta e veloz. Para conseguir pegá-lo era preciso uma peneira, tirar o gorro e colocá-lo na garrafa.

Lenda guardada na memória, e não é que um dia desses encontrei o capetinha por aí? Um não: sete. Dentre eles, o sacy fubá (que só admite seu nome grafado com y), o saci de miçanga e o saci japonês. Estão todos no livro que eu ganhei Saci, organizado por Mouzar Benedito, pela Mundo Mirim.

Pelo livro, descobri que existe uma organização, SOSACI (Sociedade dos Observadores de Saci), especializada em coletar histórias de sacis: http://www.sosaci.org/ . A entidade é uma versão atual e expandida da iniciativa do escritor Monteiro Lobato, na publicação O Saci Pererê - O Resultado de um Inquérito, fruto de uma pesquisa com os leitores do jornal O Estado de S. Paulo, em 1917 . Querendo conhecer mais sobre o mito, o escritor foi coletar a resposta em sua fonte: o povo. Dali surgiu, O Saci (1921), um dos livros do Sítio do Pica Pau Amarelo, a primeira versão escrita do herói folclórico.

Em pesquisa, descobri que a minha versão de Saci é só uma entre inúmeras. Até saci-ave tem, mais presente no Norte do Brasil. A que a gente conhece, aqui no Sudeste, é o saci-moleque. E não é só o pererê não. Mas vou parar por aqui para não dar nó na cabeça. Afinal, minha cachola não é crina de cavalo para saci nenhum trançar.

E se você vir um sacizinho por aí não relute: ele aparece justamente para quem caçoa de sua existência. Assuma a aparição e contribua mais um pouco com a cultura popular brasileira.

























Retrato do Saci-pererê (2007) por J. Marconi

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

“Vou apertar, mas não vou acender agora. Se segura malandro, pra fazer a cabeça tem hora”





Um incauto que ligasse a TV e se deparasse com a imagem de jovens com os rostos cobertos, imaginaria ser uma nova rebelião num presídio qualquer.



Na verdade, tratava-se de uma ocupação da reitoria pelos alunos da USP. O que esses estudantes pleiteavam? Poderia se supor que seria uma manifestação contra a corrupção que grassa pelo país, a impunidade de nossos representantes políticos, os números da inflação maquiados, ou ainda, o 84º lugar do Brasil no IDH divulgado pela ONU.



Pois, pasmem! O imbróglio era por conta da presença da PM no campus, o que coibiria a alegada liberdade de expressão, trocando em miúdos, o uso de maconha. Como se sabe, assaltos e até assassinatos ocorreram na USP. Então, firmou-se um convênio entre a Polícia Militar e a Secretaria da Segurança Pública, para aumentar as medidas de proteção na Cidade Universitária.



Deu-se o caso que, durante uma ronda normal, três alunos foram detidos por posse de maconha. Mesmo tendo sido liberados logo depois, um grupo de estudantes invadiu um prédio da FFLCH (Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas) como retaliação. Houve uma assembleia em que a maioria decidiu pela desocupação do edifício. A minoria derrotada, muito “democraticamente” porém, decidiu invadir a reitoria. Ou seja, a discussão toda é porque essa pequena turma de uspianos não quer ter sua liberdade de queimar um baseadinho restringida. É em defesa dessa causa tíbia que os estudantes se rebelaram, corroborando a imagem da USP como sendo um mundo paralelo. E se não bastasse, como estupidez pode ser contagiosa, aventou-se a possibilidade de uma greve geral na universidade. Depois da reintegração de posse, vários estudantes foram levados à delegacia. A fiança foi paga com dinheiro arrecadado por filiados da Conlutas (Coordenação Nacional de Lutas) em todo o país. Esses alunos, que não precisam pagar faculdade e depredam patrimônio público, ainda são libertados sem nenhum custo. Eis aí uma bela lição de cidadania.



O mais risível é que em algum momento foi dito que os estudantes eram presos políticos. Visão totalmente equivocada, querendo fazer desta veleidade estudantil uma tentativa de emular-se a jovens da época de ditadura que brigavam por ideais que valiam a pena e as faculdades eram sim o reduto sagrado para a livre expressão.



Enquanto isso, bem próximo daqui, no Chile, estudantes estão nas ruas há meses reivindicando educação pública gratuita e de qualidade.



É isso aí, bicho.



Título do post: trecho da música Malandragem dá um tempo com o Barão Vermelho

domingo, 6 de novembro de 2011

Bons livros para crianças e adolescentes

Apesar de eu ter sido uma leitora voraz desde criança, sou contra a atitude de muitos professores de Português e Redação que obrigam os alunos a lerem clássicos da nossa literatura completamente inadequados à sua idade. Não digo isso por terem conteúdo violento ou sexual...

No meu primeiro contato com Macunaíma, ainda no colégio, li a primeira página e pensei: ahn? Ele comeu o calcanhar dela?

Não entendi nada e, assim, abandonei a leitura. Anos depois, já tendo estudado o Modernismo e lido outras coisas, voltei para Macunaíma e adorei. Entendi que, sim, ele come o calcanhar dela e está tudo certo.

Empurrar Machado de Assis, José de Alencar e Clarice Lispector para alunos com pouca maturidade só tem um resultado: eles pegam birra. Não só desses autores, mas de livros em geral.

Mas você pergunta: o que fazer para meu filho(a)/sobrinho(a)/afilhado(a) etc ler alguma coisa que vá além de Crepúsculo e Diário de um Banana? Para responder, pretendo criar uma série de posts com dicas de clássicos (ou não) que ajudam a criança, o pré-adolescente e até o adolescente a ampliar o gosto literário ou, até mesmo, passar a gostar de ler.

A primeira dica é direcionada às meninas. Não que eu ache que existam livros só de meninas, mas, neste caso, parece-me que não vai ser muito atraente para garotos.


Mulherzinhas é um clássico da literatura de língua inglesa mais conhecido aqui no Brasil pela adaptação para o cinema, Adoráveis Mulheres. O livro começa com as irmãs March reclamando que não ganharão presentes no natal. O pai está na guerra e a família delas não tem muito dinheiro para viver, apesar de ter sido, no passado, uma das mais importantes da região.

Por isso, as meninas March são obrigadas a trabalhar para ajudar em casa ou a passar vergonha na escola por não poderem comprar certos luxos. Porém, como imaginação não depende de dinheiro, elas criam um grupo secreto de teatro e publicam seus próprios jornais.

O livro acompanha as meninas enquanto elas aprendem a viver sem excessos, mas com muita união. Meg, a mais velha, começa a frequentar bailes e sofre nas mãos de meninas ricas que querem transformá-la em alguém diferente do que ela é. Jô, inteligente e amante dos livros, comporta-se mais como um menino do que como uma mocinha. A doce e delicada Beth cai doente justo quando a mãe não está em casa e a mimada Amy, a caçula, gasta seu tempo pensando em como seria melhor a vida com dinheiro.

Louisa May Alcott lançou Mulherzinhas em 1868, inspirada pelas histórias dela e de suas irmãs (Jô é a personagem que representa a autora), e teve tanto sucesso que, em 1869, ganhou uma continuação, Good Wives. Além desses, a autora escreveu mais dois livros com personagens da família March: Little Men e Jo’s Boys.

É importante saber que este livro não traz uma história melada e cor-de-rosa que coloca as meninas como seres fúteis que só querem saber de vestidos e festas. Ele é delicado e mostra como as irmãs March descobrem que dinheiro, afinal, não compra amor nem felicidade.
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